Perplexo e chocado, desconcertado e abalado, admirado e espantado, fiquei sabendo que, lá, em Corinto, por volta de 409 ou 410 a.C. – no tempo que se amarrava dinossauro-bico-de-pato com fios-de-ovos, na época que Don-don jogava no Andarahy Athletico Club e não havia tanto miserê nem avultava tanto tititi e também nos idos em que os sindicatos eram fortes, os trabalhadores podiam se queixar do excesso de velocidade na linha de produção e do índice de acidentes, sem medo de serem despedidos – Diógenes¹ – o Filósofo-Cínico ou o Cínico-Filósofo – que, a essa altura do campeonato, estava bem velhinho e gagá, porém, já não era mais tão cínico nem tão filósofo quanto havia sido na sua juventude, entretanto, ainda continuava muito mal-humorado, muito mal-ajambrado, muito mal-apessoado, muito mal-agourado, muito mal-aventurado, muito mal-educado e muito mal-entrouxado, resolveu ir à praia, pegar um bronze e tomar um banho de mar. Relaxadão, de bermudão furta-cor, toscanejava e ronquejava sentado em uma cadeirinha desengonçada sob uma barraca de praia desbotada, quando, de repente, ouviu:

— Psiu... Psiu... Diógenes... Diógenes... Aqui... Na beira d'água...

Diógenes se virou, e viu uma baita Mesonychoteuthis hamiltoni² toda faceira sorrindo para ele.

— O que a senhora deseja? Deixe-me em paz. Não estou a fim de papo-furado — disse Diógenes, um tiquinho-pedacinho (mais para extremamente-exageradamente) contumelioso e malcriado.

— Eu vim lhe fazer um convite — respondeu a Mesonychoteuthis.

— Convite? Convite pra quê? Eu não saio do meu barril. — retrucou Diógenes irritadiço e ranzinza.

— Calma aí, Filósofo, eu gostaria que você conhecesse o meu lindíssimo 'tliprex', aqui pertinho, em Saramandaia Bay — disse a Mesonychoteuthis.

— 'Tliprex'? Não é 'tliprex', sua besta quadrada de burrice inclassificável; é triplex. — admoestou Diógenes mais irritadiço e ranzinza ainda.

— Está bem, Filósofo. 'Triprex'. Você vem ou não vem? — falou, com toda a calma, a Mesonychoteuthis.

— E com que roupa a senhora proprietariou esse triplex? E logo em Saramandaia Bay, que everybody macacada sabe que é Bay de ricalhouços salafras, que sempre mandam servir whisky na feijoada, e, qual tico-tico-do-mato-de-bico-preto, sempre metem o bico-de-pato no fubá mimoso? — inquiriu Diógenes, já totalmente puto da vida dentro do seu bermudão furta-cor.

— Bem, Filósofo, foi um miminho simpático dos meus admiradores federais, estaduais, municipais e delta-mais-mais, lá do Oceano Antártico, que fizeram uma vaquinha e me presentearam no Natal passado — charlou a Mesonychoteuthis toda vaidosa.

— Sabe de uma coisa, dona Mesonychoteuthis? Ninguém dá triplex a ninguém a troco de reza — asseverou Diógenes, vermelhudão de raiva. Nem com vaquinha nem sem vaquinha. Ou a senhora andou facilitando alguma maracutaia fedorenta em Saramandaia Bay ou fez coisa muito pior, que eu não quero nem saber. Eu não entro nessa porra de triplex nem a porrada; em triplex de gente rica e corrupta – como a senhora – não há lugar para se cuspir, a não ser na cara do proprietário. Agora, que eu já rosnei e disse o que precisava ser dito, vá chispando já daqui, senão eu mordo a senhora. Eu quero pegar um solzinho amigo. E fim de papo. Agora, cuidado com o Moro. Ele não é de mais hoje mais amanhã; é de mais agora! Escreveu, não leu, o pau comeu e, se bobear, se desguarneceu! Morou?

A Mesonychoteuthis cabisbaixou, botou a viola no saco, deu um peidinho sem graça, mergulhou rapidinho e se mandou para as profundezas do oceano sem-fim. Dizem que a pobrezinha foi almoçada por um Carcharodon megalodon!³

Dizem também que quando Diógenes soube que a Mesonychoteuthis havia sido comida por um Carcharodon, comentou: — Eu não sabia que o Moro havia virado tubarão-branco-gigante!

E o velho Filósofo acabou bolando este poeminha, que se perdeu no tempo, e não aparece nem nos seus fragmentos nem na sua doxografia:

 

 

 

 

A vida é o que,
na encarnação, nós transformamos.
A morte é o que,
na existência, nós não mudançamos.

E, coisificando,
o chimarrão vai fenecendo devagar.
E, quimerizando,
o camelo blatera sem voltar ao Lar!

Por isso, pelaí,
está cheio de múmias paralíticas.
Poucos seres-aí
fazem, de fato, veras autocríticas.

Divina Indiferença
é o que menos se nota aqui e ali.
Ausência de Sabença
é o que vige e triunfa ali e aqui.

E, mui devagarmente,
o mânvântâra vai se desidratando.
E, inábil e doente,
o melequento continua saçaricando!

 

 

 

A Mesonychoteuthis hamiltoni que foi almoçada por um Carcharodon megalodon!

______

Notas:

1. Diógenes de Sinope (Sinope, norte da Turquia, entre 404 e 412 a.C. – Corinto, na Grécia, cerca de 323 a.C.), também conhecido como Diógenes, o Cínico, foi um filósofo da Grécia Antiga. Os detalhes de sua vida são conhecidos através de anedotas (chreia), especialmente as reunidas pelo historiador e biógrafo dos antigos filósofos gregos Diógenes Laércio (200 – 250) em sua obra Vidas e Opiniões de Filósofos Eminentes. Diógenes de Sinope foi exilado de sua cidade natal e se mudou para Atenas, onde teria se tornado um discípulo de Antístenes (Atenas, cerca de 445 a.C. – Atenas, 365 a.C.), antigo pupilo de Sócrates (Atenas, cerca de 469 a.C. – Atenas, 399 a.C.) e o fundador da Filosofia Cínica. Diógenes acabou se tornando um mendigo que habitava as ruas de Atenas, fazendo da pobreza extrema uma virtude. Diz-se que teria vivido em um grande barril, no lugar de uma casa, e que perambulava pelas ruas carregando uma lamparina, durante o dia, alegando estar procurando por um homem honesto. Eventualmente, se estabeleceu em Corinto, onde continuou a buscar o ideal cínico da auto-suficiência: uma vida que fosse natural e não dependesse dos luxos da civilização. Por acreditar que a virtude era melhor revelada na ação e não na teoria, sua vida consistiu de uma campanha incansável para desbancar as instituições e os valores sociais do que ele via como sendo uma sociedade corrupta. Citações atribuídas a Diógenes:

• A sabedoria serve de freio à juventude, de consolação à velhice, de riqueza aos pobres e de ornamento aos ricos.

• Se eu não fosse Diógenes, gostaria de ser Diógenes.

• O amor é o emprego dos ociosos. [Aqui, entenda amor como apego.]

• Na casa de um rico não há lugar para se cuspir, a não ser em sua cara.

• Discursa sobre a virtude, e eles passarão como rebanho. Assobia e canta, e terás uma platéia.

• Para que serve um filósofo, se não para machucar os sentimentos de alguém?

• O fundamento de cada Estado é a educação da sua juventude.

• O que eu mais gosto de beber é o vinho que pertence aos outros.

• Por uma questão de autopreservação, um homem precisa de bons amigos ou de inimigos ardentes, pois, os primeiros o instruem e os últimos o levam à tarefa.

• O homem é, ao mesmo tempo, o mais inteligente e o mais bobo dos animais.

• Tem mais quem está mais contente com o mínimo.

• Existe apenas a diferença de um dedo entre um homem sábio e um tolo.

 

 

 

 

• Nós temos dois ouvidos e uma língua para ouvir mais e falar menos.

• Eu sou chamado de cão porque não adulo, rosno e mordo os patifes.

• Eu não sei nada, exceto que sou ignorante.

• A videira dá três tipos de uvas: o primeiro dá prazer, o segundo dá intoxicação e o terceiro dá desgosto.

• Geralmente, os reis sábios têm conselheiros sábios, e o próprio rei deverá ser um homem sábio, para que seja capaz de distinguir um.

• O Sol, também, brilha nas piscinas, mas, não fica poluído.

• Quando vejo marinheiros, homens de ciência e filósofos, admito que o homem é o mais sábio de todos os seres; quando vejo sacerdotes e profetas, penso que nada possa ser mais desprezível do que o homem.

• Cães e filósofos fazem o melhor, e recebem as menores recompensas.

• Eu não sei se há deuses, mas, deve haver.

• Por que não chicotear o professor, quando o aluno se comporta mal?

• A calúnia é apenas o barulho dos loucos.

• O rubor é a cor da virtude.

• Aquele que sempre tem a virtude em sua boca, porém, na prática, a negligencia é como uma harpa, que emite um som agradável para os outros, enquanto ela mesma é insensível à música.

• Não tenho nada para lhe pedir, senão que você se mova para o outro lado, para não interceptar o Sol, tirando de mim o que você não pode me dar.

• A arte de ser escravo é dominar o mestre.

• A multidão é a mãe dos tiranos.

• É preciso ser um homem sábio para descobrir um homem sábio.

• Quando vi uma criança bebendo com suas mãos na calha, eu joguei meu copo longe.

• É privilégio dos deuses não quererem nada, e é privilégio dos homens-deuses quererem tão pouco.

• Certa vez, Diógenes viu os oficiais de um templo prenderem alguém que roubou uma tigela pertencente aos tesoureiros, e disse: Os grandes ladrões estão levando o pequeno ladrão.

• Um amigo é uma alma que permanece em dois corpos.

• A expressão favorita de Theophrastus* era: o tempo é a coisa mais valiosa que um homem pode gastar.

• Não é que eu seja louco; é só que minha cabeça é diferente da sua.

• Alexandre, o Grande, encontrou Diógenes olhando atentamente para uma pilha de ossos humanos. Diógenes explicou: Estou procurando os ossos do seu pai, mas, não os distingo dos ossos dos escravos.

• Quando alguém o lembrou que o povo de Sinope o condenou ao exílio, Diógenes disse: E eu os sentenciei a ficarem em casa.

• Quando as pessoas riram dele porque ele caminhou para trás sob o pórtico, ele disse para elas: Vocês andam para trás ao longo de todo o caminho da existência, e me criticam por andar para trás ao longo do caminho de um passeio?

• Alguém perguntou qual era o momento adequado para o almoço, e Diógenes disse: Se um homem for rico, quando quiser; se for um pobre, quando puder.

• A pobreza é uma virtude que cada um pode ensinar a si mesmo.

• Quanto mais conheço as pessoas, mais eu amo o meu cachorro.

• Eu não sou um ateniense ou um grego, mas, um cidadão do mundo.

* Teofrasto (Eresos, 372 a.C. – 287 a.C.) foi um filósofo da Grécia Antiga, sucessor de Aristóteles (Estagira, 384 a.C. – Atenas, 322 a.C.) na Escola Peripatética (peripatético é uma palavra grega que significa ambulante ou itinerante; peripatéticos (ou os que passeiam) eram discípulos de Aristóteles, em razão do hábito do filósofo de ensinar ao ar livre, caminhando enquanto lia e dava preleções, sob os portais cobertos do Liceu, conhecidos como perípatos ou sob as árvores que o cercavam). Era oriundo de Eressos, em Lesbos, e seu nome original era Tirtamo, mas, ficou conhecido pela alcunha de Teofrasto, que lhe foi dada por Aristóteles, segundo se diz, para indicar suas qualidades de orador.

 

 

 

Diógenes sentado em seu barril cercado por cães.
(Pintura de Jean-Léon Gérôme de 1860)

 

 

2. A Mesonychoteuthis hamiltoni (lula-colossal) é, provavelmente, a maior espécie de lula existente, e o único membro do gênero Mesonychoteuthis. A lula-colossal é considerada o maior invertebrado em termos de massa do Planeta de que se tem conhecimento, podendo ultrapassar os 15 metros de comprimento. A Mesonychoteuthis hamiltoni, que habita as profundezas do Oceano Antártico, possui a maior cabeça de todos os tipos de lulas, e também possui os maiores olhos no reino animal, chegando ao tamanho de um prato. Dispõe de dois bicos enormes e afiados, e garras giratórias em forma de ganchos, profundamente fixados em seus tentáculos.

 

 

 

 

3. Carcharodon megalodon (também denominado megalodonte ou tubarão-branco-gigante) foi uma espécie de tubarão gigante que viveu entre 20 e 16 milhões de anos atrás, no período Mioceno, no Oceano Pacífico. O megalodonte era três vezes maior que o tubarão-branco atual, e seu tamanho podia alcançar 20 metros, com um peso que podia chegar as 50 toneladas.

 

Música de fundo:

Com Que Roupa?
Composição: Noel Rosa
Interpretação: Caetano Veloso e Zeca Pagodinho

Fonte:

http://www.krafta-musicas.cc/
playlist/gilberto-gil-com-que-roupa

 

Páginas da Internet consultadas:

https://10binary.deviantart.com/

http://www.wikiwand.com/es/Antigua_Corinto

https://sociologado.wordpress.com/2011/01/24/uel-2004-16/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Megalodonte

https://hbr.org/

https://www.canstockphoto.com.br/

https://br.depositphotos.com/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Escola_peripat%C3%A9tica

http://olivrodanatureza.blogspot.com.br/

http://moziru.com/

http://bbcpersian7.com/

https://www.goodreads.com/author/
quotes/3213618.Diogenes_of_Sinope

https://www.brainyquote.com/authors/diogenes

https://pt.wikipedia.org/wiki/Teofrasto

https://pixabay.com/

http://www.thinkstockphotos.com.pt/

http://geracaobenfica.blogspot.com/

https://www.pinterest.se/

https://thenounproject.com/term/money-bag/

https://www.amazon.com/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Lula-de-humboldt

https://pt.wikipedia.org/wiki/
Di%C3%B3genes_de_Sinope

 

Direitos autorais:

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